Nairóbi (Quênia) - Segundo dia de trabalho

Hoje nós fomos a outras 9 escolas pra continuar vendo quais estão dando continuidade aos projetos “toothbrushing” e “hand washing” e quais não. Tenho que confessar que o dia foi um pouco frustrante, porque das 9 percebemos que só 3 estavam tentando levar a sério. Algumas disseram não dar continuidade porque a escola não tem água e é caro ficar comprando água pra isso, outras disseram que perderam as escovas de dentes, outras ainda afirmaram que é uma confusão botar as crianças pra escovar os dentes todos os dias e só fazem 1 vez por semana, mas a grande maioria afirmou que as pastas de dentes acabaram e eles não tem dinheiro pra comprar mais. Uma das escolas que nós fomos parecia ver realmente a importância do projeto, mas falou que o pouco dinheiro que eles tem é pra comprar comida pras crianças e não sobra pra pasta de dente. Ficamos um bom tempo conversando com o diretor dessa escola e ele disse que muitas crianças são totalmente órfãs então não pagam a escola e comem lá de graça, recebem uniforme de graça, bebem água de graça e quando não tem pra onde ir dormem na casa dele de graça. Até as crianças que não são órfãs muitas vezes não pagam porque não tem dinheiro pra isso, e o que mais me impressionou foi saber que a mensalidade da escola custa 150 shilings (cerca de 4 reais). Espero realmente poder ajudar essa escola de alguma forma. O diretor pareceu realmente estar tentando seu melhor, praticamente tirando do seu bolso pra escola continuar existindo, já que ele não tem nenhum tipo de patrocínio.

Pensei muito hoje e cheguei a conclusão de que, embora esses dois projetos sejam importantíssimos, eles não são sustentáveis, porque nós damos escovas de dentes e pastas de dentes, mas uma vez que as pastas acabam as escolas não tem dinheiro pra repor. Não sei se o nosso projeto estará pra sempre dando pastas, então tinha que haver um jeito das escolas conseguirem as pastas sozinhas pra ser uma coisa mais sustentável. Nós falamos pra algumas escolas que elas podem escovar os dentes das crianças com água e sal enquanto não conseguimos pastas novas, mas elas não acharam uma boa ideia porque já tentaram e as crianças engolem essa água.

Também pensei muito em como fazer pra conseguir novas pastas de dentes, porque parece que a Colgate não vai querer doar de novo.  E, além de continuar procurando novos parceiros pra dar as pastas, também quero trabalhar em algum projeto mais sustentável. Alguma coisa que vá durar, que vai continuar existindo quando eu for embora daqui. Estou pensando em entrar em contato com as escolas que tem espaço e ver se posso fazer uma horta, porque assim as escolas darão alimentos mais frequentemente e mais saudáveis pras crianças e economizarão dinheiro (pra quem sabe até comprar pastas de dentes). Vou ver quanto precisamos pra isso e ver se é possível fazer, porque não sei se o projeto tem dinheiro suficiente pra arcar com o custo dessas hortas. 

A parte “boa” da história é que o projeto da Valéria (amiga colombiana que mora comigo) não esta funcionando e é quase certo dela migrar pro meu projeto e acho que juntas podemos fazer mais coisas.Tomara! :)


Acho que já escrevi sobre um monte de coisas tristes hoje, mas não queria deixar de registrar aqui duas coisas que me chocaram. A primeira foi que em uma das escolas que tentamos visitar a professora estava brigando muito feio com os alunos e nós estávamos esperando do lado de fora pra falar com ela. Ai uma aluninha minúscula (2 anos?) simplesmente saiu pela porta da escola, abaixou as calcas no meio da rua, fez coco e botou as calças de novo. Ninguém fez cara de “nossa, que estranho” ou “que nojo”. A segunda coisa é que uma das escolas que eu fui falou que é considerada uma das melhores porque da banho nas crianças 1 vez por semana e é a única que faz isso. Ok, então as outras crianças não tomam banho tipo nunca?

Pra terminar esse post de hoje queria dizer que, apesar de toda essa miséria, não há como não ficar feliz e sorrindo atoa vendo a alegria das crianças toda vez que nós chegamos até as escolas. Os sorrisos, os tchauzinhos, a curiosidade em ver e tocar os muzungos (brancos) e os  “how are you? How are you? How are you?” repetidos em coro incansáveis vezes. E o que me da mais nó na garganta é pensar no futuro tão incerto delas e que aquela alegria provavelmente desaparecerá quando ela se dar conta da realidade em que ela vive. 

Ainda não me senti a vontade pra tirar fotos das crianças, das escolas e tudo mais, mas Valéria tirou uma foto minha enquanto eu batia palmas com as crianças que cantavam pra gente juntinhas e ensaiadas: "all our visitors are welcome" :)